Trava bancária de crédito oriundo de garantia fiduciária de empresa em recuperação não pode ser sobrestada

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, nas hipóteses de recuperação judicial, não é possível o sobrestamento, ainda que parcial, da chamada trava bancária quando se trata de cessão de créditos ou recebíveis em garantia fiduciária a empréstimo tomado pela empresa devedora.

Para o colegiado, a lei não autoriza que o juízo da recuperação judicial impeça o credor fiduciário de satisfazer seu crédito diretamente com os devedores da empresa recuperanda.

No caso analisado, um banco pediu a reforma de acórdão do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) que determinou a liberação das travas bancárias que impediam uma empresa de informática em recuperação judicial de ter acesso às contas bancárias e aos valores nelas retidos.

A decisão do TJGO baseou-se na alegação da empresa de que os valores seriam bens de capital essenciais, necessários para o seu funcionamento, e que a utilização da trava bancária poderia constituir grave entrave ao êxito da recuperação judicial.

No recurso apresentado ao STJ, a instituição financeira questionou a decisão, apontando que o crédito oriundo de cessão fiduciária de recebíveis seria extraconcursal, não podendo ser submetido aos efeitos da recuperação judicial por não se constituir em bem de capital.

Bem de capital

O relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, destacou que, para ser caracterizado como bem de capital, o bem precisa ser corpóreo (móvel ou imóvel), deve ser utilizado no processo produtivo e deve se encontrar na posse da empresa.

De acordo com o ministro, a Lei 11.101/05, embora tenha excluído expressamente dos efeitos da recuperação judicial o crédito de titular da posição de proprietário fiduciário de bens imóveis ou móveis, acentuou que os bens de capital, objeto de garantia fiduciária, essenciais ao desenvolvimento da atividade empresarial, permaneceriam na posse da recuperanda durante o período de proteção (stay period).

“A exigência legal de restituição do bem ao credor fiduciário, ao final do stay period, encontrar-se-ia absolutamente frustrada, caso se pudesse conceber o crédito, cedido fiduciariamente, como sendo bem de capital”, afirmou o ministro.

Bellizze explicou que a utilização do crédito garantido fiduciariamente, independentemente da finalidade, “além de desvirtuar a própria finalidade dos ‘bens de capital’, fulmina por completo a própria garantia fiduciária, chancelando, em última análise, a burla ao comando legal que, de modo expresso, exclui o credor, titular da propriedade fiduciária, dos efeitos da recuperação judicial”.

Natureza do direito

Para Bellizze, no caso analisado, a natureza do direito creditício sobre o qual recai a garantia fiduciária – “bem incorpóreo e fungível” –, faz com que ele não possa ser classificado como bem de capital.

Assim, segundo o relator, não se configurando como bem de capital os valores objeto do questionamento, “afasta-se por completo, desse conceito, o crédito cedido fiduciariamente em garantia, como se dá, na hipótese dos autos, em relação à cessão fiduciária de créditos dados em garantia ao empréstimo tomado pela recuperanda”.

Isso porque, segundo Bellizze, por meio da cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou de títulos de crédito, o devedor fiduciante, a partir da contratação, cede “seus recebíveis” à instituição financeira, como garantia, o que permitiria à instituição financeira se apoderar diretamente do crédito ou receber o pagamento diretamente do terceiro.

Ao dar provimento ao recurso para restabelecer a trava bancária, o ministro destacou: “Pode-se concluir, in casu, não se estar diante de bem de capital, circunstância que, por expressa disposição legal, não autoriza o juízo da recuperação judicial obstar que o credor fiduciário satisfaça seu crédito diretamente com os devedores da recuperanda, no caso, por meio da denominada trava bancária”.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ

 

Indenização pelo não pagamento de verbas rescisórias requer demonstração do dano moral

Para a Turma, não ficou configurada a efetiva lesão à esfera moral do empregado.

A Quinta Turma excluiu da condenação imposta ao Município de São José do Rio Pardo (SP) e à Serviços e Obras Sociais (SOS) o pagamento de indenização por dano moral a uma empregada em razão do não pagamento das verbas rescisórias devidas. Segundo a Turma, a situação não configura automaticamente a ocorrência de lesão à esfera moral do empregado.

A assistente administrativa, contratada pela SOS, prestou serviço para a Prefeitura de São José do Rio Pardo por 26 anos. Em 2014, ela foi demitida sem justa causa e não recebeu nenhum valor a título de verbas rescisórias, além de estar com três meses de salário atrasados e vários depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) pendentes.

Dignidade da pessoa humana

Ao ingressar na Justiça, a empregada argumentou que é obrigação da empresa cumprir com todos os direitos trabalhistas e, ao optar por não fazê-lo, a SOS “afrontou o princípio da dignidade da pessoa humana”, garantido na Constituição da República. Ela sustentou que as parcelas têm natureza alimentar, necessárias para sobreviver no período que estava desempregada. Também assinalou que a SOS não havia emitido as guias do seguro-desemprego, impedindo-a de receber o benefício.

Conduta reprovável

O juízo de primeiro grau determinou à empresa e ao município o pagamento de todos os valores devidos (salários atrasados, FGTS e verbas rescisórias), mas julgou improcedente o pedido de indenização por dano moral. Segundo a sentença, ainda que o atraso no pagamento dos valores devidos fosse uma conduta reprovável, não foram provados danos concretos à empregada.

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP), no entanto, condenou a empresa e o município a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 1 mil por considerar “inequívoca a prática de ato lesivo” contra a empregada.

Jurisprudência

No exame do recurso de revista da empregada, o relator, ministro Breno Medeiros, assinalou que, de acordo com a jurisprudência atual do TST, a ausência de pagamento das verbas rescisórias, por si só, não enseja indenização por danos morais. “É necessária para a configuração do dano a existência de lesão que provoque abalo psicológico decorrente de efetiva afronta à honra, à imagem, constrangimento ou prejuízo suportado pelo trabalhador”, afirmou.

No caso, embora o Tribunal Regional tenha registrado que a falta de pagamento das verbas rescisórias havia impossibilitado o levantamento dos valores depositados na conta vinculada do FGTS e a entrega das guias para habilitação ao seguro-desemprego, tal circunstância, segundo o relator, “não possui gravidade suficiente para caracterizar a alegada afronta à esfera íntima do empregado”.

A decisão foi unânime.

Fonte: TST

 

Sindicato é legítimo para propor ação sobre intervalo para bancários digitadores

A Constituição autoriza a atuação ampla dos sindicatos na defesa da categoria.

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a legitimidade do Sindicato dos Trabalhadores do Ramo Financeiro da Zona da Mata e Sul de Minas para propor ação em que se requer o pagamento de horas extras a todos os trabalhadores que prestam ou prestaram serviços de digitação nas agências do Banco Santander (Brasil) S.A. situadas na sua base territorial. A decisão segue o entendimento de que a Constituição da República autoriza a atuação ampla dos sindicatos na defesa dos interesses da categoria.

Substituto processual

O sindicato ajuizou a ação na condição de substituto processual para questionar a supressão dos intervalos destinados à prevenção de lesões por esforço repetitivo aos digitadores (LER e DORT), conforme disposto na Norma Regulamentadora 17 do Ministério do Trabalho. O juízo da 2ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora (MG) considerou que, pela natureza do direito pleiteado, a entidade sindical não teria legitimidade para propor a ação.

No exame de recurso ordinário, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) extinguiu o processo sem resolução do mérito. No entendimento do TRT, a sentença a ser proferida, caso fosse favorável à pretensão do sindicato, “seria simplesmente inexequível do ponto de vista prático”, pois demandaria a produção de muitas provas na fase de execução a fim de identificar e individualizar os possíveis beneficiários.

Legitimidade ampla

O relator do recurso de revista do sindicato, ministro Hugo Carlos Scheuermann, assinalou que, de acordo com a jurisprudência do TST, o artigo 8º, inciso III, da Constituição da República autoriza direta e expressamente a atuação ampla dos sindicatos na defesa dos interesses da categoria, entre eles os direitos individuais subjetivos. “É evidente, no caso, a legitimidade do sindicato para pleitear os direitos postulados – horas extras decorrentes do intervalo de digitadores”, afirmou.

Por unanimidade, a Primeira Turma deu provimento ao recurso para determinar o retorno dos autos à 2ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora (MG) para que, afastada a ilegitimidade do sindicato, prossiga no processamento e no julgamento da ação.

 

Fonte: TST

 

Mantida justa causa de bancário que enviou dados de clientes para e-mail privado

A conduta foi considerada grave por deixar dados sigilosos desprotegidos.

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento ao recurso interposto por um ex-bancário do Itaú Unibanco S.A. que pretendia reverter sua dispensa por justa causa. Conforme apurado, ele copiou dados sigilosos de clientes e os enviou para o seu e-mail privado, deixando as informações expostas em ambiente desprotegido. Por maioria, os ministros entenderam que ele descumpriu norma de segurança empresarial e que a conduta poderia causar prejuízo incalculável para o banco.

Punição excessiva

A decisão foi tomada em recurso ordinário na ação rescisória ajuizada pelo bancário após o trânsito em julgado da sentença em que foi reconhecida a justa causa e indeferido o pedido de reintegração no emprego e de pagamento de verbas rescisórias. No seu entendimento, a decisão que indeferiu a reversão da dispensa contrariou o artigo 482, alínea “h”, da CLT, que prevê a indisciplina e a insubordinação como motivos para a dispensa por justa causa.

Segundo ele, a pena havia sido excessivamente severa e desproporcional à conduta que lhe fora atribuída. “ A sentença transformou um fato isolado em uma conduta reiterada”, sustentou.

Falta grave

O relator do recurso ordinário, ministro Douglas Alencar Rodrigues, observou que, embora única, a falta cometida pelo bancário poderia causar “prejuízo incalculável” ao banco. “É evidente a quebra de confiança necessária à continuidade do vínculo de emprego com a instituição financeira”, afirmou. “Assim, não se revela desproporcional a ruptura contratual por justa causa motivada em uma única conduta faltosa do trabalhador”, concluiu.

A decisão foi por maioria. Ficou vencida a ministra Delaíde Miranda Arantes, que entendeu ter havido desproporção entre a conduta do empregado e a penalidade aplicada.

Fonte: TST

 

8ª Semana Nacional da Execução Trabalhista termina com R$ 719,9 milhões para os empregados

A Justiça do Trabalho movimentou quase R$ 720 milhões durante a 8ª Semana Nacional da Execução Trabalhista, realizada de 17 a 21/9.  O valor exato alcança R$ 719.931.585,80. O resultado, divulgado pela Coordenadoria de Estatística do Tribunal Superior do Trabalho, destina-se ao pagamento de dívidas de empregadores reconhecidas em juízo.

Durante a Semana Nacional da Execução, os 24 Tribunais Regionais do Trabalho realizaram 23.064 audiências e atenderam 93.702 pessoas. Foram homologados 8.379 acordos, realizados 645 leilões e efetivados 27.858 bloqueios no BacenJud.

O presidente do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Brito Pereira, destacou dois fatores principais para se chegar a esse resultado: o envolvimento de magistrados e servidores e o comprometimento da Comissão Nacional da Efetividade na Execução Trabalhista e dos gestores regionais.

Para o coordenador da Comissão Nacional da Efetividade na Execução Trabalhista, ministro Cláudio Brandão, além da pacificação social obtida com a solução dos conflitos, o resultado contribui para aquecer o mercado de consumo em tempo de crise, com a injeção dos valores na economia e o recolhimento de tributos e contribuições previdenciárias.

Fonte: TST

 

Verba honorária pode ser habilitada junto com crédito trabalhista na recuperação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou acórdão que entendeu ser possível, na recuperação judicial, habilitar crédito oriundo de honorários advocatícios sucumbenciais em conjunto com o crédito trabalhista reconhecido judicialmente, sem a necessidade de habilitação autônoma pelo advogado, tendo em vista a legitimidade concorrente da parte.

O crédito discutido no processo é decorrente de honorários sucumbenciais fixados na sentença em reclamação trabalhista em favor do advogado do ex-empregado reclamante. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão de primeiro grau que deferiu a habilitação e reafirmou que a legitimidade entre a parte e seus advogados é concorrente.

No recurso apresentado ao STJ, as recorrentes alegaram que a legitimidade para requerer a habilitação em recuperação judicial de crédito referente à verba honorária sucumbencial seria exclusiva do advogado.

Princípio da causalidade

O relator, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que, em virtude do princípio da causalidade, é possível afirmar que a verba honorária está intrinsecamente ligada à demanda que lhe deu origem. E acrescentou: “Ainda que os honorários sucumbenciais sejam de titularidade dos advogados que atuaram no feito, a legitimidade para sua habilitação no bojo da recuperação judicial, tal qual a execução, pode ser conferida concorrentemente à parte”.

Segundo ele, a Terceira Turma do STJ tem entendimento firmado no sentido de que, “apesar da inegável autonomia entre o crédito trabalhista e o crédito resultante de honorários advocatícios sucumbenciais e da circunstância de terem sido constituídos em momentos distintos, configura-se verdadeira incongruência a submissão do principal aos efeitos da recuperação judicial – condenação ao pagamento de verba trabalhista – e a exclusão da verba honorária”.

Para o ministro, nos termos da Súmula 306 do STJ, é assegurado ao advogado o direito à execução do saldo, sem excluir a legitimidade da parte. Dessa forma, apontou Villas Bôas Cueva, é possível pedir a habilitação do crédito relativo à verba sucumbencial em conjunto com o crédito trabalhista reconhecido judicialmente ao ex-empregado.

“Se a jurisprudência desta corte assegura ser possível a execução da verba honorária de sucumbência juntamente com o crédito da parte, por coerência, também deve ser permitida que a sua habilitação seja promovida pela parte, sem a necessidade de pedido autônomo dos patronos que a representaram na demanda”, destacou.

Leia o acórdão.

Fonte: STJF

 

Seguradora deve arcar com conserto em oficina à escolha do cliente, no limite do orçamento aprovado

Se o segurado efetua o reparo do veículo em oficina cujo orçamento havia sido recusado pela seguradora e assina um termo de cessão de créditos, a seguradora tem a obrigação de ressarcir a oficina pelas despesas, nos limites do orçamento aprovado por ela.

A conclusão foi da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso da Mapfre Seguros. A turma reduziu o valor que a seguradora terá de pagar a uma oficina ao montante do orçamento aprovado por ela, descontados os valores referentes à franquia, os quais já foram pagos diretamente pelo segurado.

No caso analisado, o segurado fez os reparos do veículo em oficina cujo orçamento de R$ 4.400 havia sido recusado pela seguradora, a qual autorizou o conserto no valor máximo de R$ R$ 3.068.

O cliente pagou o valor referente à franquia (R$ 1.317) e assinou um documento para que a oficina tivesse o direito de cobrar o restante da seguradora.

O relator do caso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que, apesar da negativa da seguradora, os serviços foram prestados, o segurado pagou a franquia e firmou um termo para que a oficina pudesse cobrar da companhia de seguros a diferença de valores.

Direito creditório

As instâncias ordinárias entenderam que não houve sub-rogação convencional, tratando-se, na realidade, de mera cessão de crédito. O ministro afirmou que a oficina apenas prestou os serviços ao cliente, “ou seja, não pagou nenhuma dívida dele para se sub-rogar em seus direitos”. Segundo o relator, houve cessão de crédito, nos termos do artigo 286 do Código Civil.

“Verifica-se, assim, que o termo firmado entre a oficina e o segurado se enquadra, de fato, como uma cessão de crédito, visto que este, na ocorrência do sinistro, possui direito creditório decorrente da apólice securitária, mas tal direito é transmissível pelo valor incontroverso, qual seja, o valor do orçamento aprovado pela seguradora”, afirmou.

No caso, o valor incontroverso a ser pago pela seguradora à oficina é o valor autorizado para o conserto (R$ 3.068), menos o montante já pago pelo segurado a título de franquia (R$ 1.317).

Escolha livre

Villas Bôas Cueva citou norma da Superintendência de Seguros Privados (Susep) que garante expressamente a livre escolha de oficinas pelos segurados. Segundo o ministro, essa livre escolha não subtrai da seguradora o poder de avaliar o estado do bem sinistrado, e também o orçamento apresentado.

“Assim, ressalvados os casos de má-fé, o conserto do automóvel é feito conforme o orçamento aprovado, nos termos da autorização da seguradora”, disse o relator.

O ministro lembrou que as seguradoras comumente oferecem benefícios especiais para o uso da rede de credenciadas, mas é direito do segurado escolher a empresa na qual o veículo será reparado, já que poderá preferir uma de sua confiança.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ

 

Terceira Turma rejeita pretensão do Ecad de cobrar direitos autorais por shows de Roberto Carlos em navio

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso por meio do qual o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) cobrava direitos autorais decorrentes de apresentações do cantor Roberto Carlos no cruzeiro “Emoções em Alto Mar”, realizado em 2010 em um navio de bandeira italiana.

As instâncias ordinárias julgaram a ação improcedente ao fundamento de que competia ao Ecad comprovar que os shows ocorreram dentro dos limites marítimos brasileiros, já que o navio era estrangeiro. Esse entendimento foi ratificado no STJ.

Ônus da prova

No recurso ao STJ, o Ecad afirmou que a prova era tecnicamente impossível, visto que os planos de navegação e outros documentos indicadores do trajeto efetivamente percorrido se encontrariam em poder exclusivo dos réus. Sob esse argumento, o Ecad solicitou a inversão do ônus da prova, sustentando que caberia aos responsáveis pelo cruzeiro demonstrar, em sua defesa, que o navio se encontrava em águas internacionais.

Segundo o relator do caso, ministro Villas Bôas Cueva, a mera dificuldade de comprovar que o navio estava em mar territorial brasileiro não justifica a inversão do ônus da prova, visto que o autor da ação dispõe de meios legalmente admitidos para demonstrar o fato constitutivo de seu direito, tais como a requisição de documentos em poder dos réus, a oitiva de testemunhas, a realização de fiscalização presencial ou de perícia técnica.

Limites da jurisdição

“Sendo incontroverso que as apresentações do cantor Roberto Carlos aconteceram em navio estrangeiro, só seria viável acolher a pretensão do Ecad caso comprovado que os fatos geradores ocorreram dentro das divisas marítimas brasileiras, mais especificamente no mar territorial, haja vista os limites espaciais da jurisdição, da legislação e da própria soberania nacional”, disse o ministro.

Villas Bôas Cueva destacou que não há dúvidas a respeito da ocorrência do evento em si, o que não foi comprovado é se ocorreu ou não no Brasil. Ele destacou que não houve sequer pedido de produção de provas, pois o próprio Ecad requereu o julgamento antecipado da demanda.

“Acolher a tese do recorrente equivaleria a atribuir à referida entidade, por vias transversas, o poder de demandar a contrapartida por direitos autorais de toda e qualquer embarcação estrangeira, dentro ou fora dos limites marítimos brasileiros, criando uma espécie de inversão de ônus da prova sem previsão legal, nem proporcionalidade, e que poderia, em última análise, implicar ofensa a compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito internacional”, fundamentou o relator ao negar provimento ao recurso.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ

 

Mesmo prevista em contrato de adesão, arbitragem não prevalece quando consumidor procura via judicial

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a cláusula arbitral não prevalece quando o consumidor procura a via judicial para a solução de litígios. Segundo os ministros, é possível esse tipo de solução extrajudicial em contratos de adesão, mas desde que haja concordância entre as partes, pois o consumidor sempre terá a possibilidade de optar por levar o caso à Justiça estatal.

O autor da ação que resultou no recurso especial buscava a rescisão contratual e a restituição das quantias pagas após desistir de comprar um imóvel. Em primeiro grau, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes. O Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), porém, declarou a incompetência da Justiça comum para julgar a ação, tendo em vista a existência de cláusula arbitral entre as partes.

Segundo a empresa, essa cláusula foi redigida em negrito e exigiu a assinatura do comprador. Nela estava estabelecido que todas as controvérsias do contrato seriam resolvidas por arbitragem.

Nulidade

Para a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, a relação de consumo do caso está corporificada em um contrato de adesão, como foi reconhecido em primeiro grau. Segundo ela, a dúvida seria se nesse tipo de contrato haveria incompatibilidade entre as leis consumeristas e a da arbitragem.

A ministra disse que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) se limitou a vedar a adoção prévia e compulsória desse tipo de solução extrajudicial no momento da celebração do contrato, mas não impediu que, posteriormente, havendo consenso entre as partes, fosse instaurado o procedimento arbitral diante de eventual litígio.

Segundo explicou, a aparente incompatibilidade das normas não se sustenta ao se aplicar o princípio da especialidade das normas, uma vez que a Lei de Arbitragem versou apenas sobre contratos de adesão genéricos, subsistindo, portanto, a disposição do CDC nas hipóteses em que o contrato, mesmo que de adesão, regule uma relação de consumo.

“Ainda que o contrato chame a atenção para o fato de que se está optando pela arbitragem, o consumidor, naquele momento, não possui os elementos necessários à realização de uma escolha informada”, explicou a ministra ao citar precedentes do STJ no sentido de considerar nula a convenção de arbitragem compulsoriamente imposta ao consumidor.

Três regramentos

Em seu voto, ela esclareceu que, com a promulgação da Lei de Arbitragem, passaram a conviver em harmonia três regramentos de diferentes graus de especificidade.

A regra geral impõe a observância da arbitragem quando pactuada pelas partes, com a derrogação da jurisdição estatal. A regra específica, contida no artigo 4° da Lei 9.307/96, é aplicável aos contratos de adesão genéricos, restringindo a eficácia da cláusula compromissória. Por fim, há a regra ainda mais específica, no artigo 51 do CDC, que impõe a nulidade de cláusula que determine a utilização compulsória da arbitragem, em contratos de adesão ou não.

“A atitude do consumidor de promover o ajuizamento da ação principal perante o juízo estatal evidencia, ainda que de forma implícita, a sua discordância em submeter-se ao procedimento arbitral, não podendo, pois, nos termos do CDC, prevalecer a cláusula que impõe a sua utilização, visto ter-se dado de forma compulsória”, informou.

A Terceira Turma deu provimento ao recurso especial para determinar o retorno do processo ao TJGO, a fim de prosseguir no julgamento, afastada a cláusula arbitral.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ

 

Determinação de nova perícia com base em parâmetros de perícia tornada sem efeito ofende coisa julgada

No momento da liquidação, o magistrado não pode enviar os autos à contadoria judicial com a recomendação de que novos cálculos sejam elaborados tendo como base os parâmetros usados em perícia realizada na fase de conhecimento e que tenha sido posteriormente tornada sem efeito.

Com o entendimento de que tal determinação caracteriza ofensa à coisa julgada, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de uma empresa de bebidas para determinar que, no momento da nova perícia, seja observado o comando do acórdão que tornou sem efeito a perícia realizada anteriormente.

Segundo o relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, essa decisão dará às partes a oportunidade de formular quesitos e indicar assistentes técnicos para acompanhar a perícia que vai apurar o efetivo valor a ser ressarcido, em observância à mais ampla garantia do contraditório.

Perdas e danos

Na origem, uma distribuidora de bebidas buscou indenização por perdas e danos decorrentes do descumprimento de contrato. A perícia técnica realizada ainda na fase de conhecimento apontou que a fabricante teria de indenizá-la em R$ 18 milhões.

O tribunal estadual, no julgamento de embargos de declaração, esclareceu que mantinha a condenação da fabricante, mas tornou sem efeito a perícia, pois ela considerava elementos que não foram reconhecidos no acórdão da apelação, e por isso decidiu que outra deveria ser feita em seu lugar.

A empresa ré questionou no recurso especial a determinação do juiz, na liquidação, de que fossem utilizados na segunda perícia os mesmos parâmetros da primeira, tendo por objeto os mesmos fatos. Para a recorrente, tal comando não é válido, já que a perícia anterior foi declarada sem efeito pelo acórdão.

Sem eficácia

Para o relator, ficou configurada ofensa à coisa julgada. Ele afirmou que a literalidade do comando judicial não deixa dúvida de que a perícia realizada na fase de conhecimento não havia se mostrado condizente com os parâmetros delimitados pelo acórdão condenatório, justificando a decisão de torná-la sem efeito.

“Nesse contexto, no momento da liquidação, não poderia o magistrado enviar os autos à contadoria judicial, com a recomendação de que os cálculos fossem elaborados, ‘tendo como base os parâmetros usados na perícia realizada na fase de conhecimento’”.

Bellizze destacou que a expressão “tonar sem efeito”, utilizada pelo tribunal estadual para se referir à primeira perícia, revela a intenção de retirar sua eficácia.

Liquidação diversa

O ministro disse que, embora a Súmula 344 permita a liquidação por forma diversa da estabelecida em sentença, não há, no caso, fatos novos aptos a justificar a mudança da forma da liquidação, de arbitramento para artigos, conforme pleiteou a empresa.

“Logo, tendo o acórdão recorrido concluído pela desnecessidade de comprovação de fato novo, com vistas à apuração do valor devido, rever seus fundamentos importaria necessariamente no reexame de provas, o que é defeso nesta fase recursal, ante o óbice da Súmula 7”, afirmou o relator.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ